A frustração talvez seja, de longe, o sentimento mais difícil de ser assimilado e dito em voz alta, pelo menos para mim. Quanto mais assumo uma frustração, mais estranha me sinto e vira um círculo vicioso.
Já não durmo o sono dos justos - descobri que ser injusta consigo mesma também altera o curso do sono tranquilo.
Não posso negar que tenho trabalhado para sair desse círculo e transformar as sensações. E não tenho trabalhado só.
Durante o mês de março fiz aulas de escrita criativa com a Marcella Franco, editora da Folha de São Paulo, uma querida. A criação quando feita em grupo parece mais potente e hoje é onde encontro mais poesia. Lá conheci Caio, que escreveu um texto incrível sobre como o meu gato, o Bola, foi parar no espaço. Escrevi uma vilã em um texto cheio de diálogo e descobri que nem só de auto-ficção vive essa autora. E confirmei: adoro um palco, mesmo que na platéia só tenham cinco pessoas.
Falando em palco, sentei-me em frente a quatro palcos de teatro diferentes em poucas semanas. Compartilho aqui, para quem quiser sentir a arte na pele e no peito:
Misery - baseado em uma obra de Stephen King, com Mel Lisboa.
Sísifo - com Gregório Duvivier e texto dele e do Vinicius Calderoni.
Arrã - Texto de Vinicius Calderoni
Esperando Godot - texto de Samuel Beckett, direção de Zé Celso. Assisti no Sesc Pompéia, mas sei que vai começar a temporada no Teatro Oficina.
Termino essa seção da cartinha de hoje com a arte mais sentida na pele do mundo, na minha opinião: carnaval. Não há pele que resista a um bom samba.
Não pulei carnaval esse ano, o calendário estava estranho e eu também. Mas me reconectei com algo que eu fazia muito quando criança que é assistir os desfiles de escola de samba.
Depois que a minha escola de samba decaiu e foi parar no grupo de acesso II de São Paulo, eu fiquei um tempo sem acompanhar os desfiles. Não fazia mais sentido assistir os desfiles sem ver a minha querida Nenê passar pela avenida e depois esperar ansiosamente as notas na apuração.
Isso mudou só esse ano, depois de me conectar com o trabalho do Luiz Antonio Simas - de quem já falei aqui em edições anteriores - passei a sentir carinho pelas escolas de samba de novo. Assisti todos os desfiles do Rio de Janeiro e o da minha Nenê (que se sagrou campeã e volta para o acesso ano que vem!). Que lindo é encontrar todas as camadas das escolas de samba, que apesar de tudo e de um jeito ou de outro, existem e resistem. O desfile da Grande Rio foi absurdo, vale cada segundo e para os mais entusiastas como eu: vale ler cada linha da defesa do enredo. É aula de história, arte e religião brasileira traduzida em fantasia e alegoria.
Sinto-me irremediavelmente brasileira a cada vez que vivo o carnaval, de uma maneira ou de outra.
Ainda não é claro pra mim o porquê estou contando tudo isso, mas penso que segui um padrão: do curso de escrita às idas ao teatro e o empenho para assistir as escolas de samba, me entreguei a arte feita em grupo. Foi disso que me alimentei e talvez siga me alimentando por um tempo, e é disso que essa newsletter se trata, também.
Um beijo,
Ingrid.